Antibiografia
ANTIBIOGRAFIAS?
ARFUCH, Leonor. Antibiografias? Tradução de Dênia Sad Silveira. In: SOUZA, Eneida Maria de; TOLENTINO, Eliana da C.; MARTINS, Anderson B. (Org.). O futuro do presente: arquivo, gênero e discurso. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012. p. 13-27. (Humanitas).
RESUMO
Por Marcos Torres
Aposta para o Conceito de “Antibiografias”
No campo artístico, observa-se um vasto território de experimentação, caracterizado pela profusão de formas híbridas. Embora diversas em seus temas, essas manifestações compartilham traços que as aproximam, indicando novas formas narrativas e modos de expressão tanto estilísticos quanto composicionais. Segundo Arfuch, essas produções podem ser denominadas, provisoriamente, de “antibiografias”, ainda que careçam de análises aprofundadas nessa perspectiva e sejam frequentemente tratadas de forma singular, mais como obras de autores do que como tendências de época.
Arfuch conduz um panorama de estudos, explorando o conceito de “espaço biográfico” para propor novas abordagens ao termo “antibiografias”. Ela realiza um recorte sincrônico para compreender a cultura contemporânea, repensando as formas canônicas dos gêneros autobiográficos tradicionais — como confissões, memórias e diários íntimos — em diálogo com as formas emergentes, como a autoficção e os testemunhos. A autora destaca que essas transformações são intensificadas pelas tecnologias de comunicação e pela crescente exposição da intimidade em mídias como reality shows e redes sociais, ampliando o espaço interdisciplinar para tais estudos.
No âmbito teórico e prático, Arfuch enfatiza a evolução das formas autobiográficas, que remontam ao século XVIII e moldaram a sensibilidade do sujeito moderno. Hoje, essas formas passam por grandes transformações. Novos gêneros, como as autoficções e as antibiografias, exploram um “eu” multifacetado, em contraste com a unidade identitária tradicional. Ao apropriar-se do conceito de espaço biográfico de Philippe Lejeune, Arfuch o reformula, questionando a identidade entre autor e narrador e destacando a indissociabilidade entre ficção e realidade nas narrativas contemporâneas.
A partir de uma perspectiva interdisciplinar, Arfuch dialoga com Bakhtin sobre a multiplicidade e hibridização dos gêneros discursivos, sublinhando o papel do “outro” na construção do espaço biográfico. Essa abordagem enfatiza a interação dialógica e a inesgotável fonte de formas biográficas, que desconstroem a relação convencional entre vida e relato, conforme apontado por Lejeune.
Para Arfuch, as antibiografias se posicionam como narrativas que subvertem a unidade do “eu”, propondo desdobramentos identitários e afetivos. Exemplos incluem obras de Jean-Luc Godard e Roland Barthes, que, através de diferentes mídias, rompem com a referencialidade tradicional e promovem novas formas de autorrepresentação.
Por fim, Arfuch identifica nos blogs e nas narrativas fragmentadas de cineastas e documentaristas uma expansão das formas híbridas de narrar, marcadas por memórias não lineares e registros cotidianos. Assim, o conceito de antibiografia emerge como uma aposta teórica que desafia os limites do espaço biográfico, propondo novas perspectivas sobre memória, subjetividade e identidade.